24.2.06

Só uma vez

Coimbra é uma cidade perigosíssima. Nunca se sabe o que pode acontecer. O mais certo é não acontecer nada. É isso que faz aumentar o perigo. Quando as possibilidades se reduzem, a intensidade do que acontece aumenta exponencialmente. Isto é uma teoria que eu tenho e que por vezes se verifica.

Entrei no Captain e vi-o. O amor tinha menos quinze anos do que eu, um menino lindo. E tinha aquele ar escocês porque tinha estado dois anos em Inglaterra a tentar estudar Biologia, mas não tinha aguentado não sei o quê. Quando demos por isso eu já lhe estava a mexer e ele já me estava a mexer. Em Coimbra é perigosíssimo. As noites duram semanas, saltam-se as estações e os corações vêm à boca para se morder. Quando saímos atravessámos um jardim de árvores muito altas e copas muito escuras e levou-me para casa dele. Uma mansão abandonada, sem electricidade nem água canalizada. Tinha chegado há pouco tempo, disse-me ele. Eu não queria saber. Achei um luxo, vinte velas acesas e uma lareira frente à cama para onde me atirou ou onde tropeçámos e caímos. É claro que agora tudo é perigosíssimo e tive de o ir acalmando como pude, devagarinho. O meu menino, eu já gostava tanto dele. E fizemos o que foi possível fazer e é sempre tanto, sempre demais. Por fim adormeceu a falar-me na mãe dele. Depois saí para ir ao encontro do meu marido que me esperava impaciente no hotel, desejando que eu o satisfizesse, o que foi um duplo prazer porque trazia ainda comigo nos olhos fechados o meu lindo escocês.
Em Coimbra é perigosíssimo. Tudo acaba sempre por acontecer. Mas só uma vez.



Pedro Paixão
Nos teus braços morreríamos, 98